Este blog já teve oportunidade de apresentar uma foto de Ângelo Luisi, atual dono da Cantina Capuano, com Afonso Roperto Neto, da Cantina Roperto. Vamos a seguir contar um pouco da memória oral de Ângelo, colhida há alguns anos.
Angelo Luisi, nascido em 29/02/1920, em Casalbuono, Salerno (mais ou menos 400 kms de Roma). Pais Antonio Giulio Mariano e Tereza. Esposa Angela D’Lia. De família de músicos e artistas. O pai dirigia operetas e era organista. O nonno Giovanni tocava violino. Angelo toca bandolim e clarinete.
O pai era de mil artes, teve inclusive um cinema popular no automóvel em 1914/15 na Itália .Carregava no automóvel um projetor, que punha para fora e projetava os filmes mudos na rua mesmo (Angelo tinha uns 15, 16 anos e ajudava o pai girando a manivela.). Em 1930 o pai teve uma espécie de auto-escola, ensinava as pessoas a dirigirem.
Angelo foi para a guerra, em 1940, na comuna que morava na Itália todo mundo era fascista, camisa preta. Desde 1936 Angelo já fizera o curso de preparação para guerra, que era muito disputado, pois todo mundo queria participar. Angelo fez a guerra toda na África, lutando contra britânicos e americanos.
Foi feito prisioneiro de guerra , em 13 de maio de 1943 (mostra uma foto em 1944 com a orquestra de presos). Quando chegava um novo preso, ia sendo separado por profissão, se era pedreiro ia pra um lado, etc. No caso dos músicos, eles animavam as refeições dos majores, ficou num campo de concentração de prisioneiros dos britânicos em Túnis. Carregava seu clarinete, desmontado em 5 peças, costurado na parte interna de seu jaquetão militar. Quase se casou quando era prisioneiro com uma moça chamada Ignez. Finda a Grande Guerra, voltou para sua cidade e conheceu Angela.
A família de Angela não queria que eles se casassem, pois ele era boêmio. Mas eles se gostavam, e se casaram em 07 de fevereiro de 1949. O pai dela ia buscá-los na Itália para virem ao Brasil, mas sofria do coração e não deixou ninguém na Itália saber, e quando viajava de navio para ir para lá, teve um enfarte e faleceu. Foi jogado no mar, fato que doeu muito à sua filha Angela, e que foi reproduzido por Benedito Ruy Barbosa em sua novela Terra Nostra, que teve muitos fatos inspirados na vida de Angelo Luisi. A família da esposa já tinha imigrantes pela América do Sul e do Norte, como Venezuela, onde mantinham uma joalheria na av Simon Bolívar.
Veio para o Brasil em 23 de novembro de 1949, com a esposa grávida, no navio Conte Biancamano. Um tio de Angela, Vicente Marmo, tinha no Brasil uma fábrica de inseticidas e pagou o bilhete deles de ida e volta ( porque na época para vir tinha que ter o de volta para o caso de não dar certo aqui), para que ele viesse trabalhar com a família. A viagem durou 13 dias. Acabou desistindo de trabalhar com os parentes “Não trabalhe com os parentes, que os parentes são os dentes”. Chegou a organizar com o tio João Stemachi alguns jantares na zona norte, que eram bastante concorridos, pois assim que chegou ao Brasil foi morar com Angela em Santana.
Acabou indo trabalhar como representante de uma firma que comercializava artigos de papelaria (por dez anos), e foi morar no Tucuruvi. Achava uns chatos pelo caminho, como um português que comprou fitilho dele em rolo de 100 metros e queria conferir se tinha mesmo.
Foi um dos fundadores da Sociedade Amigos de Casalbuono. Esportista, jogava principalmente futebol, como a maioria à época. Músico como seus antepassados, gosta de tocar no banheiro, pois considera a acústica boa. Devoto de Santo Antero e Madona da Consolação. Fala em tom carinhoso e ainda apaixonado pela companheira Angela.
A Cantina Capuano era na Rua Major Diogo 263, o Francisco Capuano punha uma sardela de graça pro pessoal beliscar, como era bem apimentada dava sede e ele vendia bastante vinho. Foi uma das primeiras cantinas a servir refeição, mas do jeito que o dono queria, ficou folclórico seu encerramento de expediente às 10 da noite, quando tocava o sino da casa, e não atendia mais ninguém que quisesse entrar, avisava aos que estavam presentes que era hora de ir embora, pois ele acordava muito cedo para fazer compras no mercado.
Angelo Luisi comprou a Capuano em 1962 na Major Diogo e ali trabalhou até 1968, quando mudou então para a Conselheiro Carrão. Nessa época, próximo ao TBC, o restaurante era frequentado por muitos artistas, como Procópio Ferreira. Considerava a língua uma barreira complicada, mas com o jeitinho italiano foi superando ( os próprios clientes anotavam o pedido para ele).
Hoje as filhas e o genro tocam a Capuano (Elisabeta a mais velha é a chef; ela nasceu no dia em que ele chegou ao Brasil).
Vinho, amor e dinheiro, quanto mais melhor (azulejo na parede da Capuano).
Guarda até hoje instrumentos, documentos, revistas, fotos e lembranças no baú que trouxe quando veio da Itália, inclusive um bandolim que tem quase 100 anos.
Volta sempre para Casalbuono, onde é recebido com as honras de um lugarejo pequeno que prestigia seus filhos diletos. Já esteve 13 vezes na Itália, desde sua partida para "fazer" o Brasil. A casa onde passou sua infância não existe mais, foi destruída por um terremoto, mas os parentes sempre o acolhem com alegria. Apesar de pequena (aproximadamente 1000 habitantes), Casalbuono mandou ao Brasil na época da imigração outros filhos, como o Falci (da fábrica de chocolates). Tanto que hoje a comuna tem até uma rua com o nome de Av. Brasil.
Angelo com o Bassi, o primo dele e mais alguns formaram o Clube dos Vagabundos, que nas horas vagas se encontravam para comer e jogar futebol.
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